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ENTREVISTA GONÇALO CASEIRO - INCM

Presidente do Conselho de Administração da Imprensa Nacional Casa da Moeda

Assumindo a presidência da INCM desde outubro de 2017, tem vindo a liderar um conjunto de mudanças estruturais, com impacto direto nas dinâmicas do setor da ourivesaria, sobretudo ao nível da atuação das Contrastarias, que ganham agora novas responsabilidades e competências. Em entrevista à Jewellery Mag, Gonçalo Caseiro partilha a sua visão sobre o setor e sobre o papel atual e futuro das Contrastarias.

 

1. Passado pouco mais de um ano desde que entrou em funções, é possível fazer já um balanço?
A Imprensa Nacional – Casa da Moeda, SA, é uma empresa de capitais exclusivamente públicos, sendo uma organização multicentenária - aliás a própria Imprensa Nacional faz este ano, 250 anos - pelo que podemos sempre afirmar que, passado pouco mais de um ano da atual gestão, é devido um balanço deste período. Antes de entrarmos nessa questão, importa realçar que estamos a percorrer um processo de transformação efetiva do nosso negócio. Fomos conhecidos, mais do que o desejável, pela mercantilização da burocracia no Estado, os impressos que se compravam, que faziam do cidadão um estafeta, e que o Simplex, e bem, foi eliminando e desmaterializando, sendo que hoje somos um parceiro primordial em projetos de modernização administrativa, de inovação tecnológica, como é o caso do Cartão de Cidadão, do Passaporte Eletrónico ou, mais recentemente, do Livro de Reclamações Eletrónico. O futuro é ainda mais desafiante, na identidade digital, nas capacidades para certificar física e digitalmente artefatos, que vão desde uma garrafa de vinho, a uma peça de merchandising, garantindo ao consumidor que o que encomendou, cada vez mais online, é o que recebe em casa, entre muitos outros desafios.
 
2. Sim, mas um balanço mais concreto?
Vamos a isso. Iniciando pela vertente financeira, conseguimos manter o volume de negócios em cerca de 100M€, perspetivando-se atingir um EBIDTA de 35M€ para o ano que agora termina.
Contudo, é trivial verificarmos que as rubricas que compõem a nossa atividade alteraram-se substancialmente. Por um lado, pelas boas razões relacionadas com a recuperação de rendimentos dos nossos trabalhadores e outros direitos “congelados” durante a fase de intervenção externa. Por outro lado, também podemos facilmente concluir que esse movimento foi largamente compensado pela evolução significativa em termos de eficiência operacional, assente na aposta na inovação, o que permitiu manter um desempenho empresarial com índices bastante sólidos.

3. Quais as áreas estratégicas de intervenção neste primeiro ano de mandato?
Estes números demonstram já a prossecução de quatro eixos estratégicos, primeiro, trabalhar a eficiência interna, com aposta em novas tecnologias, na robótica, na inteligência artificial, entre outros, segundo, internacionalizar os produtos e serviços em que primamos pela excelência, veja-se por exemplo, o caso das várias equipas que temos este ano a trabalhar em São Tomé, que lançou recentemente o seu passaporte eletrónico, ou o caso de Cabo Verde, que apresentou o cartão nacional de identificação, ou ainda o caso de Moçambique, com a criação da infraestrutura de chaves criptográficas do Estado. A inovação na oferta de produtos e serviços, sendo certo que mais à frente na entrevista falaremos disso em detalhe para a área da Contrastaria e ainda, a capitalização dos nossos recursos, maximizando as competências existentes na empresa e possibilitando a internacionalização de todas as atividades especializadas de valor acrescentado, são os dois últimos eixos em que concentramos a nossa estratégia de visão para o futuro.
 
4. Mas esses eixos estratégicos têm impacto transversal nas diversas unidades de negócio?
Sim, desde a nossa vertente editorial, passando pelas atividades fabris, até às Contrastarias. Na vertente editorial, reafirmando o compromisso com os autores portugueses, lançando prémios literários em Portugal, em países de língua oficial portuguesa e, em breve, um prémio para os portugueses espalhados por esse mundo fora. Na Moeda, com novas técnicas de fabrico, novos metais e técnicas de cunhagem, entre outras inovações que serão apresentadas em breve. Na gráfica de segurança e nas soluções de segurança, onde a parceria com as universidades e os centros de investigação foi mais aprofundada, com a apresentação de novos produtos e pedidos de patentes mundiais.

5. E na Contrastaria?
Na Contrastaria, sobre a qual importa falar mais em detalhe e onde o investimento percorre os quatro eixos que referi, vamos ter novidades, já no primeiro semestre de 2019, entrará em funcionamento o novo sistema de gestão das Contrastarias, que vai permitir implementar um controlo interno mais eficaz, mas por outro lado dar uma especial relevância aos nossos clientes,   possibilitando uma comunicação em tempo real sobre o estado de um lote, bastando-lhes usar o telemóvel e questionar através de mensagem (sms), recebendo reposta pela mesma via, de forma automática. Prevê-se igualmente que no primeiro semestre de 2019, entre em funcionamento o novo site das Contrastarias, que irá dotar o setor com melhor e mais informação, sobre as marcas, oficiais ou de autor, deixando-o ao nível daquilo que melhor se faz no mundo. A melhoria dos espaços da contrastaria para beneficiar os técnicos que todos os dias tornam possível esta atividade bem como, a relação com os nossos clientes é intenção clara para nós.

6. Mas mencionou também inovação. Na Contrastaria vamos ter novidades nesse âmbito?
Apresentámos já este ano na convenção sobre o controlo e marcação de artefactos de metais preciosos, associação internacional de contrastarias e no Conselho Consultivo de Ourivesaria, a tecnologia UniqueMark, que confere a garantia da autenticidade e de rastreabilidade de uma peça, através de uma marca única, não replicável e que tem como base um algoritmo de dispersão aleatória, de fácil leitura ótica através da câmara de um simples smartphone e com ligação direta a uma plataforma, onde irão constar todas as informações relevantes, com diferentes níveis de acesso. A UniqueMark confere aos artigos detentores desta marcação um reconhecimento e rastreamento da peça, sobretudo através da ligação a uma plataforma com diferentes níveis de acesso, em qualquer espaço físico e temporal.

7. Aproximando a lupa ao setor da ourivesaria, na sua visão qual deve ser o papel das Contrastarias no apoio ao desenvolvimento e modernização do setor?
Por um lado, temos de assegurar a necessária proteção do consumidor. Tal significa melhorar a comunicação das marcas, a forma de as interpretar, entre outros aspetos. Daí o aparecimento de um novo site e a implementação de um plano de comunicação mais direta e eficaz.
Por outro lado, devemos contribuir para assegurar a concorrência leal entre os diferentes agentes económicos, por exemplo assegurando um papel muito ativo na fiscalização, mas também garantindo os procedimentos e normativos internos mais adequados às necessidades do mercado.

8. Mencionou a fiscalização, qual será a postura adotada pelas Contrastarias enquanto nova entidade fiscalizadora?
Naturalmente seremos uma entidade fiscalizadora do setor e não apenas dos operadores económicos que hoje interagem com a Contrastaria. Quero com isto observar que uma das orientações estratégicas será assegurar que a base de fiscalização é abrangente, implicando para tal um trabalho estreito com as associações. A visão de uma fiscalização eficaz, passa por uma perspetiva ampla daquilo que é a realidade deste setor, tendo como principais objetivos a proteção do consumidor e o normal funcionamento de mercado.  

9. Este foi um ano de grandes mudanças. Quais considera terem sido os pontos críticos de melhoria e inovação no serviço das Contrastarias?
Sim, é um facto que foi um ano com significativas mudanças no mundo das contrastarias, nomeadamente, na reestruturação dos serviços e na implementação de novos projetos que irão ter (e alguns já têm) impacto junto dos principais atores desta atividade. A comunicação, sendo um fator de enorme relevância, também foi alvo de melhorias, com a constituição do Conselho Consultivo de Ourivesaria, o que resultou na criação de vários grupos de trabalho temáticos com enorme significado para todo este setor.
 
10. A AORP e a INCM têm trabalhado em estreita parceria, como vê o papel das Associações na criação de uma ponte entre o setor e a vossa entidade?
Tem sido desenvolvido um trabalho bastante profícuo entre as associações do setor e a INCM, uma ponte que tem facilitado a partilha de opiniões, de esclarecimentos e uma abordagem a novos projetos e desafios para o setor. Um trabalho realizado entre todos aqueles que se sentam à mesa do Conselho Consultivo da Ourivesaria e que tem obtido excelentes resultados.
 
11. Como assiste à rápida evolução que o setor da ourivesaria tem atravessado nos últimos anos?
O setor da ourivesaria esteve durante muito tempo apoiado apenas no mercado interno e é com natural agrado que observo a internacionalização e a conquista de novos mercados, adotando novas tendências e novas formas de contato com o consumidor, que revitalizam a arte e projetam este setor para novos horizontes, aceitando desafios, em que a tradição se reinventa e se renova pela mão de jovens designers, artesãos e industriais.


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24 · 01 · 2019